O conjunto de estudos realizados recorre às metáforas do Frankenstein e Ben 10 como alusões às identidades profissionais produzidas pelos currículos da licenciatura, mediante observações, entrevistas com estudantes universitários e egressos, análises de documentos e confronto com as teorias pós-críticas. A exemplo do famoso monstro da ficção de Mary Shelley, o professor de Educação Física é construído por meio da bricolagem de partes distintas, sem conexão entre si. Produzido por um currículo que fragmenta disciplinas e saberes, se vê cooptado por discursos que narram a docência, a Educação Básica e a Educação Física de múltiplas maneiras: muitas delas infundadas, distorcidas e, principalmente, sem compromisso com a escola atual. A confusão identitária que se estabelece no curso de licenciatura desde a sua gestação, cria condições para que diferentes segmentos disputem o território didático sem preocupar-se com o sujeito da formação. Concebida como produto dessas práticas discursivas, a criatura resultante escapa das mãos do seu criador ao concluir o curso e, abandonada à própria sorte, se sente desprovida dos conhecimentos necessários para uma atuação crítica e coletiva quando se depara com a realidade escolar. Diante do chamado “choque com a realidade”, sente-se acuada e não vê outra alternativa a não ser responsabilizar os sujeitos da Educação Básica e a comunidade em que atua pela sua incompetência constatada diante da complexidade do exercício docente. Mas o curso de licenciatura forma também outro monstro, o Ben 10, um personagem do Cartoon Network que se transforma em dez espécies alienígenas para lutar contra o mal. A analogia com o professor de Educação Física não poderia ser mais acertada. Os discursos veiculados no currículo da formação inicial também produzem o professor de Educação Física como um sujeito performático, capaz de inúmeras façanhas no exercício da sua profissão. Em tempos neoliberais, o egresso assume a condição de empresário de si mesmo e tal qual o anti-herói dos desenhos animados, a cada novo perigo presente na escola, academia, clube, clínica, acantonamento ou empresa, e perante públicos distintos – estudantes, sedentários, atletas, pessoas com deficiência, idosos e trabalhadores -, o professor-Ben 10 apela a uma identidade diferente e emprega suas distintas e falhas habilidades profissionais para atuar com o intuito de vencer os desafios que se apresentam. Sem ter certeza das suas escolhas, o resultado é inesperado. É sempre uma nova aventura.